quinta-feira, 24 de abril de 2014

Onanismo: qual foi o pecado de Onã?

O caso de Onã gerou a palavra "onanismo", palavra que, segundo as definições modernas do dicionário, significa a interrupção do coito antes da ejaculação, e também se refere à prática da masturbação masculina.

Eis o que informa o texto de Gênesis 38.8-10:

"Então disse Judá a Onã: Toma a mulher do teu irmão, e casa-te com ela, e suscita descendência a teu irmãoOnã, porém, soube que esta descendência não havia de ser para ele; e aconteceu que, quando possuía a mulher de seu irmão, derramava o sêmen na terra, para não dar descendência a seu irmãoE o que fazia era mau aos olhos do Senhor, pelo que também o matou."

De acordo com o texto bíblico, pode-se constatar que Onã foi morto, essencialmente, porque sua intenção tinha por finalidade não dar descendência a seu irmão. Assim, Onã interrompia o coito, ejaculando fora do canal vaginal da mulher.

Mas... foi o coito interrompido o pecado de Onã?  Negativo!

Não confundamos a finalidade de Onã com o meio para atingi-la!  

O texto bíblico é claro, mostrando a intenção do ato de Onã:  PARA NÃO DAR DESCENDÊNCIA A SEU IRMÃO.

Explicando: Tamar era mulher de Er (irmão de Onã). Com a morte de Er, então Onã, instado por Judá (pai de Er e de Onã), uniu-se à Tamar (viúva de Er). Isto era o casamento pelo levirato (da viúva com o irmão do falecido), amplamente difundido e posteriormente incorporado à lei de Moisés.

Quando Onã interrompia o coito e ejaculava fora de Tamar, o que ele fez foi se recusar a cumprir o dever de dar descendência ao seu irmão, porque seu desejo era ficar com a herança que seria, por direito, do primogênito (herdeiro legal de Er).

Assim, as causas efetivas da morte de Onã foram:

1) a desobediência à instrução de Judá (pai de Onã);

2) sua cobiça pela herança do primogênito e;

3) o deixar de cumprir seu compromisso matrimonial específico, que era dar um filho à Tamar (viúva de seu falecido irmão).

segunda-feira, 14 de abril de 2014

Significado e origem dos ovos, coelho e chocolate na páscoa cristã

A história dos ovos de páscoa e dos coelhos é relativamente longa e interessante. Há registros de que no Egito e na Pérsia os ovos eram considerados símbolos da fertilidade e, pintados, eram dados de presente nas comemorações do inicio da primavera.

Como visto, a Páscoa cristã foi relacionada ao Equinócio de Primavera, em Niceia, 325 d.C. Considerando que, pelo menos inicialmente, a comemoração maior era referente à Ressurreição de Jesus; e, considerando, que ressurreição lembra nascimento, por sincretismo, houve uma natural aproximação entre ovos e Páscoa. Os cristãos primitivos da Mesopotâmia foram os primeiros a usar ovos coloridos na Páscoa.

Na Alemanha Medieval, a tradição cristã da Páscoa como a festa da ressurreição de Cristo, em que a morte não é vista como o fim e sim como o começo de uma nova vida, está ligada a elementos da mitologia germânica. O próprio termo alemão relativo à Páscoa, Ostern, deriva de Ostara, a deusa germânica da primavera. Desse radical germânico surgiu Easter, páscoa em inglês. Ostern é a primeira das grandes festas germânicas da primavera, representando a vitória do sol aquecedor sobre as trevas e o frio do inverno, a vitória da vida sobre a morte, lembrando a ressurreição de Cristo.

O costume de se procurar os ovos de Páscoa no jardim também estaria baseado na crença dos germanos e de outros povos antigos de que o ovo é o símbolo da fertilidade e da nova vida em crescimento.

O coelho, símbolo de fertilidade na mitologia grega, é o animal sagrado atribuído tanto a Afrodite, a deusa do amor dos romanos, como a Ostara. Além das origens mitológicas, o coelho é um dos primeiros animais que saem das tocas ao chegar a primavera, após um longo inverno de recolhimento, dando, portanto, a ideia de renovação da vida, que parecia estar morta durante o inverno. Ademais, por se reproduzirem com extrema facilidade e em grande quantidade, com eles houve a identificação de uma vida abundante, de um processo de restauração, um ciclo que se renova todos os anos.

A tradição do coelho da Páscoa foi trazida às colônias inglesas na América do Norte, por imigrantes alemães, em meados de 1700. Através do recurso à prosopopeia, o coelhinho “visitava” as crianças, escondendo os ovos coloridos que elas teriam de encontrar na manhã de Páscoa. Esses ovos coloridos eram feitos de doce folheado e açúcar candy.

A inserção do chocolate nesse contexto simbólico da páscoa cristã também tem um componente de sincretismo. Originário da América Central e México, sendo considerado sagrado pelas culturas maia e asteca, logo se divulgou que possuía poderes afrodisíacos. Tal característica pode ter levado à associação do chocolate com a fertilidade do coelho. Com o advento da Era Industrial, a partir do século XVIII, e o aperfeiçoamento e comercialização generalizada dos produtos derivados do chocolate, houve um grande interesse comercial em achocolatar os ovos “trazidos” pelos coelhos na Páscoa.

Por José Roberto Costanza, Th.M.
Coordenador de Teologia Histórica do Seminário Teológico Presbiteriano Rev. Ashbel Green Simonton.

Fonte: http://www.ipandorinhas.com.br/estudo/arquivo.php?cod=108


quinta-feira, 10 de abril de 2014

Antigamente, o casamento não passava pela Igreja

Atualmente, é comum aos cristãos se casarem na igreja, na presença de um ministro do evangelho.  Mas, nos tempos antigos, o casamento nem passava pela Igreja...

O conceito e prática do casamento de nossos dias não surgiu de forma pronta, é fruto de uma evolução histórica, social e teológica. É interessante notar como se deu a evolução conceitual ao longo dos tempos, desde o AT até a era da Igreja.  

No Antigo Testamento -- como no Oriente Antigo em geral -- o matrimônio não era da alçada religiosa nem civil, mas um assunto privado, entre as famílias interessadas.  Em Israel, não parece estar associada a aplicação de um sentido necessariamente religioso ao casamento.  Ele é uma questão de direito particular e acontece sem a atuação conjunta de instância do Estado e da religião.

Tempos depois, desde a época de Inácio de Antioquia e outros, a aprovação e bênção dos líderes das comunidades cristãs foi considerada desejável, mas foi tardiamente, e com alguma dificuldade, que a Igreja passou a ter influência sobre os enlaces matrimoniais. Até no séc. VII, o Direito Canônico nada fala sobre uma colaboração eclesiástica no contrato matrimonial.

Foi a partir da Idade Média que o casamento foi sendo transferido do âmbito da família para o espaço público eclesiástico, havendo, a partir disto, um maior desenvolvimento litúrgico. É nesta época que começa a se atribuir cada vez mais importância da atuação da Igreja, a ponto de que, por ocasião do enlace, um voto passar a ser uma declaração ministerial ("Deus vos coniungat. Ego vos coniungo."). Naquela época, no entanto, a validade do matrimônio ainda não dependia de uma cerimônia oficial.

No séc. XI, o movimento dos cátaros e dos albigenses (os quais rejeitavam o casamento com base em concepções hostis ao corpo) representou um imenso desafio para a reflexão teológica. Em contraposição a isto, eis que surge a necessidade de aclarar teologicamente a razão de o matrimônio ser valorizado positivamente. Nesse contexto, por meio de um documento eclesiástico oficial, que a Igreja vem designar, no ano de 1184, o matrimônio enquanto sacramento.

quarta-feira, 12 de março de 2014

A Guerra Ideológica contra o Cristianismo

Por Silas Daniel

Todo mal tem um início. Não é diferente com as idéias que permeiam atualmente a sociedade ocidental. Que o diga Russell Kirk. Russell Amos Kirk (1918-1994) foi um notório cientista político norte-americano e crítico social, conhecido pelo seu conservadorismo. Em 1953, ele lançou um livro que se tornou clássico rapidamente nos Estados Unidos, sendo considerado hoje a melhor obra para entender a formação e o desenvolvimento do conservadorismo na tradição anglo-americana. Por tabela, a obra apresenta também as raízes e o desenvolvimento do pensamento liberal no Ocidente. Estamos falando de The Conservative Mind: from Burke to Eliot (O Conservadorismo: de Burke a Eliot).

Nesse livro, o crítico americano afirma que a onda liberal que hoje vemos no mundo (com a pregação a favor do aborto, da liberação das drogas e da promiscuidade sexual) nasceu no período histórico denominado “Idade da Razão”, especialmente no século 18. Kirk diz ainda que um dos primeiros a denunciar eloqüentemente os efeitos nefastos do liberalismo em sua gênese foi Edmund Burke (1729-1797), pensador e político britânico.

Segundo Kirk, antevendo o futuro, Burke criticou em sua época três escolas que chamou de “radicais” e que estavam tornando-se bastante populares em seus dias: (a) o racionalismo dos filósofos; (b) o nascente utilitarismo do filósofo e jurista inglês Jeremy Bentham; e (c) o sentimentalismo romântico do filósofo francês Rousseau. Esse último Burke chegou a chamar de “o Sócrates louco”.

O detalhe é que, em sua análise, o político britânico identificou alguns pontos que caracterizaram a onda liberal daquela época, dando-lhe base. Entre eles estão:

1) A crença de que, se Deus existe, “difere radicalmente em sua natureza da idéia do Deus cristão; ele seria ou o ser remoto e impassível dos deístas ou o brumoso e recém-criado Deus de Rousseau”;
2) A idéia de que o homem, diferentemente do que a Bíblia diz, não é tendente ao pecado, mas é naturalmente bom, generoso e benevolente, sendo corrompido pelas instituições;
3) A convicção de que as tradições da humanidade e o ensino bíblico são mitos, confusos e ilusórios, e nos ensinam muito pouco;
4) A fé no ser humano, como sendo capaz de aprimorar-se sozinho e trazer a paz e a ordem ao mundo sem precisar de alguma ajuda divina;
5) O pensamento de que devemos buscar a “libertação das velhas crenças, dos tabus, dos juramentos e das velhas instituições”, e regozijarmo-nos com “a pura liberdade e a auto-satisfação”.

Como vemos, foi ali, no século 18, que a atual onda liberal teve seu início.
Foi Jean Jacques Rousseau quem “decretou” a morte do pecado, ao pregar a teoria da plena bondade natural do ser humano. Depois dele, veio Augusto Comte, com o seu positivismo, afirmando que a religião é o estado primitivo da sociedade. O iluminismo proclamou que a religião não era mais relevante. Assim, chegamos ao ponto onde estamos hoje.

Esses cinco pontos esposados por Edmund Burke explicam, por exemplo, o porquê de a sociedade de hoje viver em um nível moral muito baixo. Já dizia Russell Kirk, em sua obra supracitada, que “problemas políticos e sociais são, no fundo, problemas religiosos e morais”. E ele não está errado. As questões sociais são, lá no fundo, uma questão de moral pessoal. Não é necessário um grande exercício mental para perceber isso.

A sociedade está moralmente à deriva

Imagine uma sociedade onde as pessoas são governadas pela crença em uma ordem moral duradoura, por um forte sentido de certo e errado, por convicções pessoais sobre a justiça e a honra. Com certeza será uma sociedade sadia, que fugirá tanto do extremo da tirania quanto do seu oposto, a anarquia. Agora, imagine uma outra sociedade, onde as pessoas vivem moralmente sem rumo, ignorando o certo e o errado. Seria uma sociedade onde cada um estaria voltado para sua gratificação pessoal, atrás da satisfação de seus próprios apetites. Sem dúvida, seria uma sociedade doentia, tanto na sua versão mais radical (o anarquismo) quanto na sua versão mais leve, como está tentando ser implementado hoje em todo o Ocidente.

Sobre isso, escreve Kirk:
“O conservador se esforça por limitar e balancear o poder político para que não surjam nem a anarquia, nem a tirania. No entanto, em todas as épocas, homens e mulheres foram tentados a derrubar os limites colocados sobre o poder, a favor de um capricho temporário. É uma característica do radical que ele pense o poder como uma força para o bem – desde que o poder caia em suas mãos. Em nome da liberdade, os revolucionários franceses e russos aboliram os limites tradicionais ao poder, mas o poder não pode ser abolido e ele sempre acha um jeito de terminar nas mãos de alguém.”
“O poder que os revolucionários pensavam ser opressor nas mãos do antigo regime tornou-se muitas vezes mais tirânico nas mãos dos novos mestres do Estado.”
“Sabendo que a natureza humana é uma mistura do bem e do mal, o conservador não coloca sua confiança na mera benevolência. Restrições constitucionais, freios e contrapesos políticos (checks and balances), correta coerção das leis, a rede tradicional e intricada de contenções sobre a vontade e o apetite – tudo isto o conservador aprova como instrumento de liberdade e de ordem. Um governo justo mantém uma tensão saudável entre as reivindicações da autoridade e as reivindicações da liberdade.”

À medida que o tempo passa, os valores morais vão perdendo seu significado e força, o que resulta em uma sociedade cada vez mais neurótica, hedonista, egoísta e violenta. Não é à toa que é bastante comum vermos os pensadores pós-modernos identificando a sociedade em que vivemos como inundada de patologias, crises e profundos vazios existenciais.

Um sintoma da crise em que vive o mundo é a atual produção artística no planeta. Sabemos que a produção artística de uma época diz muito sobre os problemas, angústias, medos, conquistas, sonhos e aspirações de uma geração. Ora, os livros de ficção, filmes, peças teatrais e pinturas de hoje estão repletos de personagens psicóticos ou figuras que não trazem substancialmente nada, só o vazio. Isso é porque a alma humana no século 21 encontra-se assim.

Outro dia um articulista carioca escreveu, em sua coluna em um dos jornais mais influentes do país, sobre sua profunda infelicidade existencial, chegando a afirmar que tinha inveja da lagartixa, que não aspira nada, a não ser a satisfação de seus instintos naturais. E não foram poucos os que se identificaram com ele!

Os perigos de uma sociedade assim é que, por não ter firmeza moral e sentido na existência, está aberta a qualquer bizarria. O único conceito que consegue-se assimilar é o que diz: “Não se pode reprimir direitos”. Mas onde estão os deveres? Apesar de ainda existirem alguns deveres reconhecidos, até mesmo estes, vez por outra, são questionados por celebrizadas “mentes privilegiadas” de nossos dias. Isso porque, via de regra, o que prevalece no inconsciente coletivo da sociedade de hoje é a idéia de que o dever é visto como mal, “castrador”, destruidor, camisa-de-força. Por isso, os projetos de lei de hoje, em sua maioria, não buscam impor limites; pelo contrário, os retiram.

O cristão genuíno, porém, não sofre essas crises, pois tem a Palavra de Deus, que é sua regra de fé e prática. Seu comportamento e pensamentos são pautados por ela, o que, em vez de inibir sua vocação e suas habilidades, as desenvolvem. Ele percebe limites e, por isso, compreende a existência como um todo e, em particular, a sua missão na vida. Isso porque sem limites é impossível andar com segurança ou mesmo entender a existência. Limites são uma necessidade da própria existência. Eles foram criados pelo próprio Deus para o melhor aproveitamento da vida. Desrespeitá-los é ser infeliz ou infelicitar o próximo.

A sociedade de hoje precisa de valores. Isso significa não só limites, mas também sentido, caminho. Em outras palavras, o mundo necessita da Palavra de Deus. O mundo precisa de Cristo.

Os terríveis efeitos do liberalismo


Thomas Sowell, doutor em Economia pela Universidade de Chicago, publicou recentemente um artigo mostrando que a teoria de que a revolução liberal dos anos 60 trouxe benefícios para a sociedade é uma grande mentira. Ele cita dados em seu próprio país, os Estados Unidos, que provam a falácia de tal argumentação. Escreve Sowell:

“Os esquerdistas podem pensar que os anos 1960 foram o começo de muitas tendências ‘progressistas’ na sociedade norte-americana, mas os frios e duros fatos contam uma história muito diferente. Os anos 60 marcam o fim de muitas tendências benéficas que aconteciam há anos e uma reversão completa dessas tendências quando programas, políticas e ideologias dos esquerdistas foram implantados”.
“A gravidez de adolescentes estava caindo há anos. O que também acontecia com as doenças venéreas. A taxa de infecção por sífilis em 1960 era metade do que tinha sido em 1950. Havia tendências similares em relação a crimes. O número total de assassinatos nos EUA em 1960 era menor que em 1950, 1940 ou 1930 – apesar da população estar crescendo e dois novos Estados terem sido adicionados. A taxa de assassinatos, em relação à população, em 1960, era metade do que era em 1934”.
“Cada uma dessas tendências benéficas reverteu-se agudamente depois que noções esquerdistas ganharam iminência nos anos 60. Em 1974, a taxa de assassinatos já havia dobrado. Mesmo o ícone esquerdista Sargent Shriver, diretor da agência que dirigia a ‘guerra contra a pobreza’, admitiu que ‘as doenças venéreas saíram do controle apesar de termos acesso a mais clínicas, mais medicamentos e mais educação sexual do que em qualquer momento na história’”.

No Brasil, não é diferente. Só para citar um exemplo: a mensagem de que sexo antes do casamento não tem nada de mais, basta apenas usar preservativos, tem feito mais mal do que bem. Ela é fruto da visão liberal que prevalece na sociedade de nossos dias. Chega a ser ridículo ver a mídia pregar o sexo livre como normal e depois falar de responsabilidade, preservativos etc. Querem tentar amenizar o problema em vez de atacar a sua raiz. O que temos visto na prática é o aumento do número de adolescentes grávidas.
E a onda liberal continua, querendo legalizar o aborto e o uso de drogas, e anunciando a prostituição como uma profissão normal e digna. E ainda têm a ousadia de chamar tudo isso de “avanço”. É o fim.

Silas Daniel é ministro evangélico da Assembléia de Deus em Artur Rios, Rio de Janeiro (RJ)
Fonte: http://www.elnet.com.br/colunistas_interna.php?materia=1710


Mas vós, quem dizeis que eu sou?

Perspectivas sobre Jesus Cristo no decorrer da história

Por Alderi Souza de Matos

Os Evangelhos informam que desde o ministério terreno de Jesus houve dúvidas quanto à sua verdadeira identidade. No texto da confissão de Pedro, em resposta à pergunta de Jesus sobre quem o povo dizia ser ele, os discípulos responderam: João Batista, Elias, Jeremias ou “algum dos profetas” (Mt 16.14). Quando Jesus indagou a opinião dos seus próprios seguidores, Pedro deu a resposta correta (“Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo”). Mas uma leitura mais ampla dos sinóticos mostra que os apóstolos ainda assim tinham muitas perplexidades acerca da verdadeira natureza do seu mestre. Fora do círculo mais estreito em torno de Jesus, as dúvidas podiam se tornar especialmente intensas. João Batista, o primo e precursor de Jesus, fez a dolorosa pergunta: “És tu aquele que estava para vir ou havemos de esperar outro?” (Mt 11.3). Ao longo dos Evangelhos, ressoa a exclamação das multidões e dos líderes religiosos judeus: “Quem é este...?” (Mt 8.27; Lc 5.21; 7.49; Jo 1.19; 8.25).

A principal razão dessas dúvidas era a própria complexidade da pessoa de Jesus, em muitos aspectos tão intensamente humano, porém ao mesmo tempo marcado por características, atributos e feitos singulares, extraordinários. Os seus títulos, demonstrações de autoridade e afirmações ousadas sobre si mesmo deixavam os seus interlocutores aturdidos, admirados ou simplesmente chocados e irados. Adicionalmente, havia um elemento de mistério em torno daquela pessoa, de segredo acerca da sua verdadeira identidade, tema esse que é destacado nos Evangelhos. O chamado “segredo messiânico” reforça a idéia de que Jesus ao mesmo tempo se oculta e se revela. Somente aqueles que crêem, que se identificam com ele, podem conhecer realmente quem ele é. Após a ressurreição, os discípulos se tornam mais seguros a respeito de Jesus (Jo 21.12), o que não impede que, com o passar do tempo, surjam novos questionamentos.

O humano e o divino

A resposta de Pedro, conhecida como a “Grande Confissão”, foi muito importante, mas não respondeu todas as dúvidas. O que realmente significava dizer que Jesus era o “Cristo” (Messias) e o “Filho de Deus”? Quais as implicações mais profundas dessas afirmações? Essas questões ocuparam a mente dos cristãos por vários séculos e as tentativas de solução giraram em torno de dois pólos: a humanidade e a divindade de Jesus. Num primeiro momento, a preocupação em resguardar o monoteísmo fez com que muitos cristãos tivessem reservas quanto à divindade de Cristo. Nunca se pôs em dúvida a importância, a dignidade e a singularidade de Jesus; afinal, desde o início os cristãos sabiam ter uma relação especial com ele, tinham sido batizados em seu nome e o confessavam como Senhor. Todavia, muitos sentiam que aceitar a sua divindade implicava dissolver a unidade de Deus, ou seja, admitir a existência de dois deuses, o Pai e o Filho.

Essa preocupação em preservar o monoteísmo em prejuízo do reconhecimento do caráter divino de Cristo ficou conhecida na história como “monarquianismo”. Este, por sua vez, dividiu-se em duas correntes principais: o monarquianismo dinâmico ou adocianismo dizia que Jesus foi um ser humano que Deus adotou como filho por ocasião do seu batismo, quando ele foi revestido do poder (“dynamis”) do Espírito Santo. Os ebionitas, isto é, os cristãos hebreus, que pouco antes da destruição de Jerusalém se transferiram para o outro lado do rio Jordão, foram adocianistas. Já o monarquianismo modalista entendia que Pai, Filho e Espírito Santo eram manifestações sucessivas, e não simultâneas, de Deus. Essa corrente não fazia distinções no Ser Divino, chegando alguns a ponto de dizer que o Pai sofreu e morreu na cruz, posição essa conhecida como patripassianismo.

Simultaneamente ao monarquianismo, e mesmo antes dele, surgiu uma espécie muito diferente de questionamento, motivada por pressupostos bastante distintos. Influenciados pela cultura e filosofia grega, os gnósticos afirmavam a maldade inerente da matéria e, por conseguinte, não podiam admitir o conceito de encarnação. Sua tendência era dar ênfase ao caráter divino do Verbo (Logos), em detrimento da sua humanidade. Aquele Jesus com o qual os discípulos se relacionaram tinha apenas uma aparência de humanidade, era como que um fantasma, um ser etéreo que viveu entre eles. Daí terem ficado conhecidos como docetistas (do verbo grego dokéo = “parecer”). Essa posição já é claramente combatida nas epístolas joaninas do Novo Testamento (1 Jo 4.2,3; 2 Jo 7), e um grande número de textos afirma de modo enfático um entendimento literal da encarnação (Jo 1.14; Rm 1.3; Cl 1.22; 1 Tm 3.16; Hb 5.7; 1 Pe 4.1).

A era dos credos

Com o passar do tempo, à medida que o debate se ampliava e aprofundava, surgiram posições mais sofisticadas acerca do assunto. A mais famosa e controvertida foi o arianismo, proposta no início do quarto século pelo presbítero Ário, de Alexandria, no Egito. Essa concepção interpretava de modo muito literal a linguagem bíblica sobre Pai e Filho e sobre o conceito de geração. Ário afirmava que o Pai gerou o Filho, que só então passou a existir, e por meio deste fez o restante da criação. Portanto, Cristo era um ser muito exaltado, mas não divino. Outras posições resultaram das ênfases de duas escolas de interpretação bíblica, a de Alexandria e a de Antioquia, a primeira insistindo na união das duas naturezas e a segunda, em sua separação. Segundo o bispo Apolinário, o Cristo encarnado consistia de um corpo humano dotado de uma razão divina, o Logos. Outro bispo mais famoso, Nestório, insistiu que Jesus Cristo consistia na “união moral” de duas pessoas como em um matrimônio. Finalmente, o monge Eutiques, indo na direção oposta, defendeu a virtual fusão das duas naturezas, resultando em uma só, a divina. Essa posição também ficou conhecida como monofisismo.

Diante de um cenário tão confuso, a igreja sentiu a necessidade de posicionar-se a respeito dessa questão crucial que envolvia o correto entendimento do centro de sua fé: a pessoa de Jesus Cristo. Quatro grandes concílios ecumênicos realizados na Ásia Menor nos séculos quarto e quinto trataram dessa questão (Nicéia, Constantinopla, Éfeso e Calcedônia). A Definição de Calcedônia, do ano 451, resolveu a controvérsia de maneira magistral ao declarar não só a perfeita divindade e a perfeita humanidade de Cristo, mas o fato de que as duas naturezas, ao mesmo tempo distintas e inseparáveis, formam uma só pessoa e subsistência (“união hipostática”). Entendeu-se que essa concepção era não só coerente com o testemunho das Escrituras, mas necessária em virtude de suas implicações soteriológicas. Desde então, esse entendimento tem sido adotado pela maior parte da cristandade.

Novas teorias, antigas idéias

Ao longo dos séculos, têm surgido as mais diversas interpretações acerca de Cristo, que geralmente não passam de reedições, com outros nomes, das antigas posições consideradas heterodoxas. De um modo geral, essas posições tendem a minimizar ou simplesmente negar a divindade de Cristo, dando grande ênfase à sua humanidade. Foi o que aconteceu, na época da Reforma, com o espanhol Miguel Serveto e os italianos Lélio e Fausto Socino, que ensinaram formas particulares de adocianismo. Mais tarde, as modernas Testemunhas de Jeová iriam abraçar uma posição muito semelhante à do antigo arianismo.

Os principais reformadores protestantes, Lutero e Calvino, diferiram parcialmente nas suas concepções acerca da natureza humana de Cristo. O primeiro insistiu que, por causa da encarnação, a humanidade de Cristo, inclusive o seu corpo glorificado, recebeu o atributo da ubiqüidade, estando em todos os lugares ao mesmo tempo. Já os calvinistas argumentaram que, mesmo agora, após a sua ressurreição e ascensão, o homem Jesus está corporalmente localizado no céu. Isso levou as duas tradições a terem compreensões bastante diferentes da presença de Cristo no sacramento da Ceia. No entanto, por um bom tempo, os protestantes, acompanhando os católicos romanos e os ortodoxos gregos, mantiveram unanimemente a antiga cristologia de Calcedônia.

A partir do iluminismo, com a sua crítica à visão sobrenaturalista da religião, voltaram a ser abraçadas as antigas concepções acerca de Cristo que insistiam na sua humanidade, negando a sua transcendência. O deísmo do século 18 e a teologia liberal protestante do século 19 conceberam Jesus em termos exclusivamente humanos, ainda que dotado de notáveis atributos morais e espirituais. Teólogos influentes, como os alemães Schleiermacher e Ritschl, propuseram formas elaboradas de adocianismo. Finalmente, no século 20, ganhou força a célebre “busca do Jesus histórico”, que procurou fazer uma distinção radical entre o Jesus concreto de carne e osso que viveu na Palestina e o Cristo da fé imaginado e idealizado pela igreja primitiva. Uma concepção especialmente revolucionária foi proposta por Rudolf Bultmann, um exegeta e teólogo alemão que pretendeu desmitologizar ou desmitificar o Jesus dos Evangelhos, desvestindo-o de sua roupagem miraculosa e interpretando a sua pessoa e missão em termos do pensamento existencialista.

Perspectivas de Cristo

Ao lado das perenes controvérsias em torno da humanidade e divindade do Redentor, diferentes épocas e diferentes movimentos da história da igreja têm tido as suas percepções particulares acerca de Cristo. Para os primeiros cristãos ele era o Senhor, por amor de quem eles enfrentaram a ira do Império Romano e o martírio. Nas primeiras manifestações da arte cristã, ele é a figura benevolente do Bom Pastor, também representado pelo peixe, a pomba ou o cordeiro. Na igreja imperial da era constantiniana, ele passa a ser visto como o Cristo exaltado e todo-poderoso, o pantokrátor (“governante de tudo”). Mais tarde, na segunda metade da Idade Média, dá-se ênfase ao Cristo sofredor, o “varão de dores” dos místicos e visionários.

Ao longo do tempo, os cristãos têm encontrado dificuldade em manter um equilíbrio saudável entre as dimensões sobrenatural e humana de Cristo. Na espiritualidade do tipo pietista, marcada pelo individualismo e pelo misticismo, predomina uma concepção docética de Cristo. A sua humanidade fica obscurecida, dando-se toda a ênfase ao Senhor poderoso e transcendente, operador de maravilhas e solucionador de problemas, que está prestes a voltar em glória para arrebatar a sua igreja. Por outro lado, existe o Cristo predominantemente humano do liberalismo, tanto católico quanto protestante. Um bom exemplo foi o “evangelho social” do início do século 20, inspirador de um ativismo cristão ilustrado pelo livro Em Seus Passos que Faria Jesus? Essa também foi uma ênfase da “teologia da libertação” latino-americana da segunda metade do século 20, que viu na figura de Jesus de Nazaré um modelo a ser seguido na luta contra a injustiça e a opressão.

Essas duas perspectivas padecem de limitações. A primeira, de tendência docética, pode levar, e com freqüência leva, a uma atitude de alienação e escapismo em relação aos problemas do mundo e da sociedade. É característica de boa parcela do evangelicalismo conservador e entusiástico. A outra perspectiva é igualmente reducionista, limitando a aplicação dos ricos conceitos bíblicos de libertação e reconciliação ao plano social e político. O reino de Deus passa a ser visto exclusivamente em termos terrenos, de transformação das estruturas mediante a ação humana, e Cristo torna-se um mero símbolo e um exemplo a ser seguido nesse esforço. O ideal é que os cristãos, em sua reflexão e em sua práxis, recuperem a visão bíblica holística de Jesus Cristo, como aquele cuja obra libertadora e reconciliadora abrange todas as dimensões da existência.

Alderi Souza de Matos é doutor em história da igreja pela Universidade de Boston e historiador oficial da Igreja Presbiteriana do Brasil.